Pesquisadores ajudam a preservar 'fragmentos' de cerrado perto de cidades
fonte: https://globoplay.globo.com/v/11932666/
Pesquisadores ajudam a preservar 'fragmentos' de cerrado perto de cidades
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As matas ciliares são áreas de vegetação que estão no entorno dos rios, lagoas, represas, nascentes, entre outros corpos hídricos. O nome para esse tipo de cobertura vegetal é dado devido à função que estas áreas desempenham, que é de proteção aos corpos hídricos. Assim como os cílios funcionam como proteção para nossos olhos, as matas ciliares funcionam como um filtro para entrada de sedimentos e poluição nos rios.
O Código Florestal de 2012 considerou as áreas de matas ciliares como Área de Preservação Permanente (APP). A partir dessa legislação, classificaram-se as matas ciliares como imunes ao corte. Dessa forma, houve uma maior proteção a vegetação, diminuindo assim os impactos nos recursos hídricos. Além disso, as matas ciliares passaram a ter uma maior atenção por meio do setor público. Portanto, houve um aumento de ações de recuperação das áreas degradadas que estavam as matas ciliares, principalmente em áreas de maior interesse público.
O Código Florestal estabeleceu os limites das áreas de APP ao entorno dos rios, conforme a largura do corpo d’água. Assim, cursos d’água com menos de 10 metros de largura devem ter pelo menos 30 metros de vegetação. Rios com largura de 10 a 50 metros devem ter uma faixa de vegetação de 50 metros. Já, os rios com largura de 50 a 200 metros, com pelo menos 100 metros de área ciliar. Rios com largura 200 a 600 metros, mata ciliar com pelo menos 200 metros. E rios com largura superior a 600 metros, as áreas ciliares devem ter 500 metros. Além disso, a legislação também estabeleceu limites das faixas de vegetação ao entorno de reservatórios artificiais.
Como já mencionado, as matas ciliares funcionam como barreiras para a sedimentação dos rios, porém essas áreas também são fundamentais para os animais, as plantas e para a biodiversidade. Normalmente, os animais utilizam essas áreas como passagem, devido à proximidade com as fontes hídricas, que servem a água para a fauna. Além disso, existem espécies de plantas que necessitam de uma maior disponibilidade hídrica para crescerem e desenvolveram. Assim também, as áreas ciliares desempenham serviços ecossistêmicos importantes, como a apreciação, abastecimento, e estruturação dos solos, evitando enchente.
As matas ciliares auxiliam na filtragem e drenagem pluvial da água para os lençóis freáticos, e os aquíferos. Dessa forma, essas áreas verdes contribuem na manutenção e recarga dos rios, bem como de corpos d´água próximos. Além disso, as raízes das plantas que estão próximas aos rios estruturam os solos, impedindo a ocorrência de eventos erosivos, bem como, as inundações, enchentes, e deslocamento de terra. E por fim, as matas ciliares aumentam a qualidade e na quantidade das águas, o que impactam diretamente a sociedade atual e futura.
A sociedade depende diretamente dos corpos hídricos para a sua sobrevivência. No entanto, como relatado, negligenciou-se a conservação e proteção dos rios. O assoreamento é um bom exemplo para ilustrar isso. Esse fenômeno acontece de forma natural, mas pode-se intensificar pela ação humana. A intensificação desse processo tem consequências destrutivas para o homem, uma vez que os corpos hídricos são responsáveis pelo abastecimento humano, dos animais, além de auxiliar na irrigação das plantações.
O assoreamento ocorre pelo escoamento de sedimentos trazidos pela chuva, em que se transporta a camada superficial do solo até os rios, esta depositada no fundo. Dessa forma, quando os rios não possuem em suas margens a vegetação, os sedimentos chegam no rio, em uma maior quantidade, e em maior velocidade, pois nesse caso não há barreiras para impedir os sedimentos. Além de sedimentos do solo, pode-se carregar lixo e esgoto para o rio, causando sérios riscos para o homem, animais e plantas.
O material que chega nos rios é levado e depositado em partes mais planas dos rios. Muitas vezes, formam-se grandes bancos de areia que prejudica a navegabilidade dos rios e o escoamento fluvial. Além disso, o material sedimentado pode ser tóxico, causando desiquilíbrio ambiental, em virtude dos peixes e outros animais que vivem nos rios. Cabe ressaltar, que a sedimentação dos rios, podem provocar o desvio e acúmulo de água em determinados pontos, causando enchentes e deslizamentos de terra.
O desmatamento em matas ciliares vem intensificando na proporção que as atividades antrópicas crescem próximas aos cursos d’água. Apesar de serem classificadas com áreas de preservação permanente, existem diversas ações ilegais em áreas de matas ciliares. Muitas situações poderiam ser evitadas com a fiscalização adequada, no entanto, o pessoal responsável não é suficiente para banir essas situações. As áreas de matas ciliares percorrem muitos quilômetros e estão vulneráveis ao desmatamento.
As causas para o desmatamento em matas ciliares são inúmeras, e ocorrem principalmente devido à proximidade com os rios. As principais causas são a agricultura e a pecuária. No caso da agricultura, muitas culturas agrícolas exigem uma irrigação periodicamente. Assim, muitas vezes, desmatam-se as matas ciliares para a instalação dos plantios. Além disso, existem algumas instalações de pastagem nessas áreas, em decorrência da proximidade com os rios para o gado, o que causa perda da biodiversidade local. Outros fatores também têm causado o desmatamento das áreas ciliares, como o plantio de espécies florestais, a construção de casas e edifícios, entre outros. No entanto, é importante deixar claro, que essas atividades em áreas ciliares são ilegais, e fere o código florestal.
Como já mostrado ao longo do texto, as matas ciliares são imprescritíveis para o homem e o meio ambiente. A conservação e preservação dessas áreas são passos fundamentais, para uma sociedade equilibrada e possível. Porém, o conhecimento dos recursos disponíveis nessas áreas é importante para gerar uma conscientização e legislação cada vez mais justa para as matas ciliares. Para isso, realizam-se os inventários florestais para conhecer o estoque presente e realizar estimativas do potencial dessas florestas.
Nesse contexto, realiza-se o inventário florestal em matas ciliares de forma diferente dos inventários em outras áreas. As matas ciliares, em muitos casos, são faixas contínuas e estreitas, por isso a alocação das parcelas deve respeitar as dimensões das matas. Ademais, deve-se coletar as medidas de critério de inclusão do diâmetro à altura do peito (DAP), dimensões da parcela, e outras variáveis dendrométricas observando o tipo de vegetação amostrada. Cabe ressaltar, que em certos locais são de difícil acesso, e estão em áreas de conflito, por isso, antes da realização do inventário florestal, deve-se realizar um planejamento preciso.
Diante da importância das matas ciliares, deve-se realizar diversas medidas para auxiliar na preservação das nossas matas. No entanto, é salutar ressaltar que as ações devem ser feitas de forma conjunta e bem projetada entre as diferentes entidades da sociedade. Em outras palavras, os órgãos públicos, ONGs e universidades devem implementar ações preventivas em conjunto para conseguirmos alcançar um ambiente mais equilibrado.
A principal medida é conscientização da população sobre a importância das matas ciliares para os rios, e diretamente para a sociedade. Nesse sentido, a população deve compreender o valor da água, e principalmente a importância da qualidade e da quantidade da água para o ser humano. Essa conscientização deve ser realizada por meio da educação ambiental em escolas, universidades, associações, praças, órgãos privados e públicos, para se alcançar um maior público possível.
Uma ação fundamental é a recuperação das áreas degradadas em matas ciliares. Assim, deve-se realizar essa ação de forma técnica, respeitando a distância do rio, escolhendo as espécies adequadas, e o espaçamento das plantas. Por exemplo, nada adiantará plantar mudas que não estão adaptadas as condições dos locais que forem plantadas. Outras questões importantes são a quantidade de mudas e sementes, e a qualidade das espécies escolhidas. Dessa forma, deve-se planejar adequadamente os requisitos técnicos para o enriquecimento de uma mata ciliar ou a sua total recuperação.
Além das ações já citadas, medidas que podem proteger os rios e as matas ciliares, são o cercamento das matas ciliares em áreas próximas à pecuária, que impedirá que o gado alcance o rio, e cause compactação do solo. Ademais, a conservação dos solos das áreas próximas, como exemplo evitar queimadas, promover plantios em curvas de nível, plantios em consórcios, entre outras ações que promovem a conservação dos solos. Atrelado a isso, uma medida fundamental é a fiscalização por meio de órgãos públicos, para evitar ações ilegais de desmatamento nas matas ciliares.
Nesse contexto, as matas ciliares merecem uma atenção especial por toda a população, uma vez que a manutenção dessas matas está diretamente atrelada ao bem-estar da sociedade. Por isso, devemos exigir que os representantes dos órgãos responsáveis ajam para proteger as matas ciliares e responsabilizar os culpados pelo desmatamento ilegal. No entanto, a conscientização deve vir primeiramente de todos nós, com medidas simples e possíveis. Como exemplo, fazer o descarte correto do lixo, realizar a utilização correta e consciente da água. Por fim, só conseguimos um ambiente equilibrado e sustentável, se todas as esferas da sociedade agirem de forma adequada e respeitosa.
José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – As plantas do Cerrado evoluíram, ao longo de milhares de anos, na presença de queimadas espontâneas. O efeito da fumaça na germinação de sementes de 44 espécies vegetais típicas desse bioma foi tema de pesquisa publicada por cientistas da Universidade Estadual Paulista (Unesp) no periódico Plant Ecology. Segundo os autores, os resultados poderão ser utilizados para otimizar a restauração de áreas degradadas.
O estudo foi conduzido pelo doutorando Gabriel Schmidt Teixeira Motta, sob a orientação da professora da Unesp Rosana Marta Kolb.
“Pesquisas anteriores investigaram a ação da fumaça sobre algumas poucas espécies, mas o levantamento feito neste estudo é o mais completo já realizado no Cerrado. O Gabriel avaliou o efeito da fumaça na germinação de 44 espécies do estrato herbáceo-arbustivo do bioma, envolvendo gramíneas, outras ervas [não gramíneas], subarbustos e arbustos”, diz Kolb.
A pesquisadora informa que a fumaça contém centenas de substâncias, que podem favorecer ou prejudicar a germinação de sementes, dependendo das espécies. As mais conhecidas delas são as carriquinas, reguladores da germinação e do crescimento encontrados na queima de material vegetal. As carriquinas interagem com os hormônios das plantas, promovendo a germinação de certas sementes e inibindo o desenvolvimento de outras.
“Como a pesquisa feita diretamente com fumaça gasosa envolve variáveis difíceis de replicar, optamos por utilizar ‘água de fumaça’ disponibilizada comercialmente. Ela produz um efeito equivalente ao da chuva depois da queimada. E sua ação pode ser facilmente reproduzida por outros pesquisadores”, explica Kolb. E conta que, em seu laboratório, foram empregadas duas concentrações de “água de fumaça”: 2,5% e 5,0%.
Aplicações práticas
O estudo em pauta enfocou o efeito individual das duas concentrações de água de fumaça na germinação das sementes das 44 espécies, sem se preocupar com a definição de estratégias de manejo. Mas as aplicações práticas são óbvias: sementes que respondem bem poderão ser semeadas em áreas que sofreram a ação do fogo ou ainda previamente tratadas com “água de fumaça”, na concentração adequada, antes da semeadura em campo, em áreas degradadas por pecuária e outros usos do solo. “Verificamos que, não apenas as plantas típicas de savanas, mas até mesmo algumas espécies de campos úmidos, que não evoluíram na presença de fogo intenso e frequente, responderam bem ao tratamento com fumaça”, destaca Kolb.
Das 44 espécies estudadas, 14 delas (32% do total) mostraram aumento na germinação em resposta à fumaça, com variações dependendo da concentração. Por outro lado, quatro espécies (9% do total) exibiram uma redução significativa na germinação, particularmente na concentração mais alta, de 5%. As gramíneas, em especial, germinaram mais rapidamente em resposta à fumaça, com destaque para Ctenium polystachyum e Saccharum villosum, que apresentaram redução substancial no tempo médio de germinação após tratamento com “água de fumaça”.
“Os resultados indicam que a fumaça pode atuar como um estímulo importante para a germinação em algumas espécies do Cerrado, oferecendo uma vantagem competitiva no ambiente pós-fogo. A pesquisa sugere que as respostas à fumaça são altamente específicas para cada espécie e variam de acordo com a forma de crescimento e o tipo de comunidade vegetal”, resume Kolb.
Além de Motta e Kolb, Natashi Pilon e Alessandra Fidelis participaram do estudo. A pesquisa recebeu apoio da FAPESP por meio do projeto “Atributos adaptativos ao fogo de sementes de espécies do Cerrado”, coordenado por Fidelis, e da bolsa de pós-doutorado concedida a Pilon.
O artigo Smoke Effects on the Germination of Cerrado Species pode ser acessado em: https://link.springer.com/article/10.1007/s11258-024-01427-4.
André Julião | Agência FAPESP – Uma bactéria que vive no solo e é conhecida por fixar nitrogênio quando associada às raízes de algumas plantas influencia de forma decisiva a capacidade de reprodução de uma espécie nativa de leguminosa chamada chamaecrista (Chamaecrista latistipula). Isso porque a presença do microrganismo no solo aumenta a atratividade das flores para os polinizadores, como revela estudo publicado esta semana no American Journal of Botany.
Essa relação entre microrganismos, plantas e animais é conhecida como mutualismo. Os mutualismos são interações entre indivíduos de diferentes espécies em que todas as partes saem ganhando, obtendo nutrientes ou se reproduzindo com a ajuda um do outro.
É o que acontece com a chamaecrista, uma leguminosa nativa do Brasil que vive em solos naturalmente pobres em nutrientes e que depende de um tipo específico de polinizador para poder se reproduzir.
“Um dos mutualismos importantes nessa espécie de planta é com as bactérias fixadoras de nitrogênio na raiz, que aumentam a disponibilidade desse nutriente para as plantas em troca de açúcares, que servem como alimento para os microrganismos”, conta Anselmo Nogueira, professor do Centro de Ciências Naturais e Humanas da Universidade Federal do ABC (CCNH-UFABC), em São Bernardo do Campo.
“Há outro mutualismo entre essas plantas e um tipo específico de polinizador. O pólen da chamaecrista fica encapsulado numa parte das flores e só é liberado por vibração, quando a flor é chacoalhada principalmente por fêmeas de algumas espécies de mamangava do gênero Bombus”, completa.
Experimentos realizados no Laboratório de Interações Planta-Animal, coordenado por Nogueira, mostraram que a presença dessas bactérias principalmente em solos pobres em nutrientes é fundamental para que as flores sejam atrativas para as mamangavas.
“Observamos ainda um efeito drástico, que não esperávamos. Como a associação das plantas com as bactérias é muito custosa para a planta, supomos que, num solo rico em nitrogênio, as plantas simplesmente aproveitariam o nutriente diretamente do solo. Nos nossos experimentos, porém, solos ricos em nutrientes não produziram plantas saudáveis, com flores atrativas”, explica Caroline Souza, primeira autora do estudo apoiado por bolsa de treinamento técnico da FAPESP.
O trabalho integra o projeto “Efeitos sinérgicos de múltiplos mutualistas nas plantas: como bactérias, formigas e abelhas contribuem para a evolução de um grupo de leguminosas”, vinculado ao Programa BIOTA-FAPESP e coordenado por Nogueira.
Bactéria, planta e inseto
Para chegar aos resultados, os pesquisadores acompanharam o crescimento de 60 pés de chamaecrista, desde a germinação das sementes, por 16 meses. As plantas foram cultivadas em duas condições de solo. Metade em uma mistura composta de 90% de areia e 10% de terra vegetal, com uma baixa concentração de nutrientes, especialmente nitrogênio. A outra metade foi cultivada em solo rico em matéria orgânica e suplementado com nitrato de potássio, que libera nitrogênio no solo. A acidez dos dois solos foi monitorada por seis meses, para garantir que ambos estivessem neutros e não influenciassem a relação entre raízes e bactérias.
Antes das sementes serem plantadas, porém, foram esterilizadas com álcool, água sanitária e peróxido de hidrogênio, a fim de eliminar qualquer bactéria que pudesse influenciar os resultados. Logo depois, foram lavadas com água destilada. Com o mesmo objetivo, o solo passou por esterilização em uma autoclave, em que os microrganismos são eliminados por altas temperaturas.
Os dois tipos de solo foram então subdivididos em quatro tratamentos. Em metade dos potes com solo arenoso e pouco nitrogênio e em metade das plantas cultivadas em solo rico em matéria orgânica e nitrogênio foi acrescentada uma solução rica em rizóbio, um tipo de bactéria conhecido pela capacidade de fixar nitrogênio nas raízes. Os demais potes permaneceram sem as bactérias. Os microrganismos aplicados foram isolados diretamente de nódulos das raízes da mesma espécie de chamaecrista obtidas em populações naturais.
Nos solos arenosos e pobres em nitrogênio, em que as bactérias não foram adicionadas, as plantas cresceram muito pouco, com folhas sempre amareladas evidenciando carência de nitrogênio. As plantas que obtiveram melhor desenvolvimento foram as cultivadas em solo arenoso e com presença de rizóbio.
Nódulos das raizes de chamaecrista, onde os rizóbios se proliferam e fixam o nitrogênio, especialmente quando as
plantas estão em solo arenoso com baixa disponibilidade de nutrientes (foto: Anselmo Nogueira)
“Nos solos arenosos pobres em nitrogênio, mas com a presença das bactérias fixadoras de nitrogênio, as plantas eram quase duas vezes mais altas e três vezes maiores do que as cultivadas em solo com matéria orgânica, rico tanto em bactérias quanto em nitrogênio. Por outro lado, plantas em solos pobres em rizóbio, tanto no solo arenoso quanto no rico em matéria orgânica, tiveram alturas relativamente mais baixas e eram menores no geral do que as que tinham rizóbio”, relata Nogueira.
Além disso, as flores foram analisadas com um espectrofotômetro de superfície, instrumento que mede como a luz é refletida. “A partir dessas medidas de reflectância nas flores, testamos se os contrastes de cor perceptíveis às abelhas foram alterados entre os diferentes tratamentos de solo e bactérias”, relata Souza.
A maior parte dos componentes das flores não teve padrões diferentes entre os tratamentos. No entanto, as anteras das flores que cresceram em solo arenoso, pobre em nitrogênio e rico em rizóbio, exibiram um padrão considerado mais atrativo para as mamangavas, que enxergam em um espectro de luz diferente do nosso.
“As anteras são justamente onde fica o pólen das flores, que só pode ser acessado por insetos que conseguem vibrá-las, algo que espécies exóticas como as abelhas europeias (Apis mellifera) não conseguem”, afirma Souza.
O pólen é uma fonte de proteínas essencial para o desenvolvimento das larvas das abelhas, incluindo as mamangavas e demais abelhas nativas.
Realizadas as medições, os pesquisadores tiraram as plantas dos vasos para analisar as raízes. Uma indicação de que houve uma interação entre rizóbio e planta é a quantidade de nódulos nas raízes.
Os nódulos são estruturas formadas nas raízes quando as bactérias infectam as plantas por essa via. É neles que se dá a simbiose mutualista entre plantas e bactérias e onde as bactérias fixam o nitrogênio atmosférico, produzindo aminoácidos essenciais para as plantas. Em contrapartida, as plantas fornecem açúcares para as bactérias, que se proliferam dentro dos nódulos.
Á esquerda: plantas de chamaecrista inoculadas com as bactérias fixadoras de nitrogênio no final do experimento. As maiores com muitas flores estão em solo arenoso com poucos nutrientes, as plantas menores com folhas verde mais claras estão em solo com muita matéria orgânica, rico em nutrientes. À direita: plantas de chamaecrista que não foram inoculadas com as bactérias fixadoras de nitrogênio no final do experimento. Independentemente do tipo de solo, todas as plantas ficaram baixas, quase sem flores, e produziram folhas pálidas e amareladas, com menor produção de clorofila (clorose), evidenciando o déficit de nitrogênio (fotos: Anselmo Nogueira)
De todos os tratamentos, o que mais resultou em nódulos foi o dos solos arenosos, pobres em nitrogênio, mas com presença de rizóbio.
“Queremos saber agora se esse pólen, acessível apenas às fêmeas de abelhas nativas, é enriquecido de proteínas e aminoácidos por conta dessa parceria entre bactérias e plantas. A maior atratividade das flores pode estar ligada a uma maior qualidade e quantidade dos recursos, influenciados pela alta taxa de fixação de nitrogênio nas raízes dessas plantas”, encerra Nogueira.
O artigo Nitrogen-fixing bacteria boost floral attractiveness in a tropical legume species during nutrient limitation pode ser lido em: https://bsapubs.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/ajb2.16363.
O eucalipto, além de ser utilizado para diversos fins na indústria, gerando inúmeros produtos úteis para a sociedade a partir de sua madeira, tais como móveis, pisos, forros, papel, celulose e tantos outros na indústria de base florestal, também é bastante requisitado como planta ornamental.
André Julião | Agência FAPESP – Um grupo de pesquisadores apoiado pela FAPESP observou que critérios fundamentais para definir se uma área de Mata Atlântica pode ou não ser suprimida por seus proprietários são pouco claros. Com isso, podem dar margem para o desmatamento legal de áreas que prestam importantes serviços ecossistêmicos.
O grupo propõe mudanças que podem simplificar o processo de licenciamento para o proprietário, ao mesmo tempo em que tornam a política de conservação mais efetiva. O estudo foi publicado na revista Perspectives in Ecology and Conservation.
“A legislação, de modo geral, determina que florestas em estágio inicial, com exceção das inclusas na área obrigatória de conservação [Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanente], podem ser suprimidas em até 100%, a depender do caso”, explica Angélica Resende, primeira autora do estudo, realizado como parte de seu pós-doutorado, com bolsa da FAPESP, na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP).
“No entanto, resoluções como a do Estado de São Paulo não determinam um método para fazer uma classificação do estágio da floresta que realmente meça os atributos mais importantes dessas áreas, o que dá margem a distorções”, completa.
Além do levantamento do estágio de sucessão florestal, como é chamado esse critério, outro requisito nos pedidos de autorização para supressão de Mata Atlântica é o inventário da flora da área a ser desmatada, a fim de verificar a diversidade de espécies arbóreas e a ocorrência de espécies ameaçadas de extinção.
No entanto, os autores argumentam que a tarefa exige um grau de especialidade muito alto, uma vez que o bioma tem um número muito elevado de espécies e os grupos vegetais variam bastante de uma região para outra ou até numa mesma região. Isso torna virtualmente impossível seguir a determinação à risca se não com um especialista muito bem treinado.
Por isso, o grupo propõe eliminar essa etapa numa primeira parte do pedido de autorização e aplicá-la num segundo momento, apenas nos autorizados na fase inicial. Os levantamentos seriam realizados por técnicos certificados ou a serviço do governo.
O estudo integra o projeto “Compreendendo florestas restauradas para o benefício das pessoas e da natureza – NewFor”, apoiado pela FAPESP no âmbito do Programa BIOTA e coordenado por Pedro Brancalion, professor da Esalq-USP.
“Existe uma necessidade de conservar e restaurar mais, por conta dos compromissos firmados pelo Brasil e pelo Estado de São Paulo em cumprir metas de emissão de gases de efeito estufa, sem falar na prestação de outros serviços pelas florestas, como a polinização das lavouras e a proteção de mananciais de água”, conta Brancalion.
Como está hoje, acrescenta, a legislação é facilmente burlada, o que pode levar à supressão de florestas em estágio avançado. Por fim, a norma é de compreensão bastante complexa para proprietários de terra e técnicos.
Remanescente em floresta ombrófila na região da Cantareira. Florestas primárias como essa prestam muitos serviços ambientais e são priorizadas para conservação (foto: Projeto NewFor)
Legislação
Quando alguém pretende derrubar uma área de Mata Atlântica de sua propriedade, seja para abrir uma nova área de produção agropecuária ou de habitação, uma regra básica é que 20% do total da propriedade tenha floresta. Essa é a chamada Reserva Legal, segundo a Lei de Proteção da Vegetação Nativa, mais conhecida como Código Florestal e promulgada em 2012.
A Lei da Mata Atlântica, de 2006, determina os estágios de sucessão florestal e os usos autorizados dessas florestas em todo o Brasil. Na esfera estadual, é determinado o quanto pode ser suprimido de floresta entre os casos que se encaixam na lei federal.
Em São Paulo, a regra é estabelecida pela Resolução 01/1994 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama). Embora o Conama seja um órgão federal, a regra foi estabelecida em conjunto com o Estado, que serviu de inspiração para outras unidades federativas.
Se um proprietário já cumpre a regra dos 20% de Reserva Legal, mais as Áreas de Proteção Permanentes (APPs), como topos de morro, nascentes e margens de corpos d’água, e quer derrubar outra parte ou toda a floresta “excedente”, pode pedir uma autorização para o órgão ambiental estadual para realizar a supressão.
Para conseguir a licença, ele contrata um técnico, que depois de um estudo da área emite um laudo para a secretaria de meio ambiente do seu Estado. Um dos principais critérios para autorizar o desmatamento legal é se a floresta for considerada nova, o que a classifica como em “estágio inicial”.
Segundo a lei, uma floresta nesse estágio, com árvores de até 8 metros de altura e troncos com diâmetros de até 10 centímetros, não prestaria tantos serviços ecossistêmicos como uma floresta primária.
As florestas primárias, ou em estágios mais avançados, são conhecidas por abrigar um grande número de espécies. Podem tornar o clima mais ameno, gerar água, estocar carbono e prover polinizadores, entre outros serviços ecossistêmicos. Por isso, são tidas como prioritárias para a conservação.
Problemas
Como a legislação não especifica os critérios fundamentais para medir o estágio da floresta, alguém que esteja cumprindo a regra pode, no limite, classificar erroneamente uma floresta como em estágio inicial.
Isso porque um dos critérios para determinar o estágio de sucessão florestal é a média de diâmetro dos troncos em uma determinada área, sem que a legislação defina nem mesmo o tamanho mínimo dessa área a ser inventariada. A legislação nem sequer estabelece o diâmetro mínimo na altura do peito, parâmetro usado em trabalhos científicos, por empresas florestais e mesmo em leis de outros Estados.
“Com isso, quem está fazendo o inventário florestal pode escolher o diâmetro mais baixo, mesmo que esteja cercado de árvores centenárias, baixando a média e alcançando o patamar para que o desmatamento legal seja autorizado”, aponta Resende.
Num exemplo apresentado no estudo, outro grupo de pesquisadores avaliou remanescentes conservados e matas secundárias na Serra do Mar, uma das maiores áreas contínuas de Mata Atlântica do Brasil. Foram encontradas árvores com uma média de 12,7 centímetros de diâmetro e 9,1 metros de altura, considerando todos os indivíduos acima de 4,8 centímetros de diâmetro.
“Se fossem seguidos os parâmetros do Conama, essa floresta rica em biomassa poderia ser classificada como em estágio inicial ou intermediária”, exemplifica Resende.
Propostas
Para superar deficiências como esta, os pesquisadores propõem alterações na resolução do Conama seguida no Estado de São Paulo. Uma delas é separar os tipos de floresta (fitofisionomias), reconhecendo as diferenças naturais entre essas formações. A partir daí, estabelecer um diâmetro mínimo para as árvores a serem inventariadas.
Outra proposta é definir uma área mínima de amostragem para determinar o estágio da floresta, como toda a área em locais com menos de meio hectare ou 1% da área em terrenos acima de 5 hectares, por exemplo. Hoje, uma área desse tamanho pode ser avaliada com apenas uma parcela de 10 metros quadrados, por exemplo.
Para uma revisão, um dos possíveis caminhos a seguir seria a proposta apresentada na última parte do artigo, que sugere que a avaliação seja feita em duas etapas. A primeira, pelo próprio dono da terra, sem necessariamente precisar de um técnico.
O órgão ambiental estadual então verificaria o histórico de uso e cobertura do solo dos últimos 40 anos daquela área por meio de ferramentas disponíveis gratuitamente, como MapBiomas e Google Earth, além de fotos feitas pelo requerente.
O órgão ambiental então aprovaria ou não o pedido em primeira instância, encaminhando os aprovados para uma segunda avaliação. Na segunda etapa, técnicos indicados pelo governo fariam a avaliação florística, a fim de verificar o grau de biodiversidade e a presença de espécies ameaçadas. Dessa forma, pouparia o proprietário de pagar por um serviço que poucas pessoas têm condição de realizar com excelência.
Por fim, seriam avaliados aspectos sociais e de paisagem, adotando um ou mais serviços ambientais como indicadores. O foco seria não apenas na sociedade de modo geral, mas na população local, mais afetada pela remoção da floresta, com a perda de serviços ecossistêmicos como água, bem-estar e regulagem do clima.
“A Lei da Mata Atlântica foi uma grande vitória para a sociedade brasileira. No entanto, um novo escopo técnico é necessário para reforçá-la quase duas décadas após sua promulgação e mais de três décadas depois da resolução estadual. O conhecimento sobre a Mata Atlântica aumentou dramaticamente nos últimos anos e está disponível para desenvolver regras mais efetivas e baseadas na ciência”, encerram os autores.
O estudo contou ainda com apoio da FAPESP por meio do Núcleo de Análise e Síntese de Soluções Baseadas na Natureza (BIOTA Síntese), do Centro de Ciência para o Desenvolvimento Estratégia Mata Atlântica (CCD-EMA), além de bolsas de pós-doutorado (22/14605-0, 20/06734-0, 22/07712-5 e 23/00412-9).
O artigo How to enhance Atlantic Forest protection? Dealing with the shortcomings of successional stages classification pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2530064424000221.